Na Primavera de 2008 fiz a leitura dos quatro primeiros livros da obra de Platão, A República. Nestes, o tema perseguido nos diálogos, em síntese, é a conceituação da Justiça. No entanto passa-se por diversos e importantes temas sobre educação, eugenia, eutanásia, formação do exército, dentre outros.
Hoje disponibilizo aqui o trabalho que realizei de estudos a respeito do livros supracitados, no qual abordo os métodos de investigação filosófica contidos nos mesmos. Uma resenha que poderá auxiliar bastante a todos os que se interessam pelo estudo dos textos de Platão. Antes, porém, indico a leitura do texto neste blog publicado sobre a leitura do diálogo Laques, também de Platão, onde, além de uma análise mais profunda sobre o método Elenchos, são analisadas algumas questões introdutórias nos diálogos em que Sócrates aparece, tais como o chamado "Problema de Sócrates", conhecimento necessário à compreensão das diversas facetas do personagem.
Desde já peço desculpas por eventuais erros gramaticais, uma vez que não revisei o texto antes de postar devido a ausência de tempo para o mesmo.
Desde já peço desculpas por eventuais erros gramaticais, uma vez que não revisei o texto antes de postar devido a ausência de tempo para o mesmo.
Boa leitura!
- Introdução
A República de Platão é uma obra composta por dez livros, cujos temas
envolvem questões sobre teoria e ordem política e social que se preocupa, em
última instância, com a educação, do povo, dos guardiões e, sobretudo, do
governante ideal, o Rei-Filósofo. Os livros são redigidos na forma de diálogos
e narrados em primeira pessoa por Sócrates, que quase sempre é um dos
interlocutores dos diálogos. O Título é latinizado, república origina-se do
latim res publica que significa bem
público.
O objeto deste trabalho se resume à análise dos quatro primeiros livros,
quais buscam uma conceituação do que é a justiça. O objetivo é analisar o
método empregado na investigação filosófica em cada um dos quatro livros, quais
envolvem métodos considerados ora genuinamente socráticos, ora genuinamente
platônicos, posto que, é pacífico na tradição acadêmica da História da
Filosofia Antiga, que o livro I é um diálogo de Primeira Época, enquanto os
outros se classificam com sendo diálogos de Terceira Época. [1]
Muito já se questionou a
respeito das razões que levaram Platão a usar o diálogo de Primeira Época
contido no Livro I como prelúdio da República, uma das principais obras de sua
filosofia. A resposta mais aceita é que sua intenção foi evidenciar as limitações
da filosofia socrática, que refuta o falso conhecimento, mas não avança na
investigação, resultando sempre em aporia.
A questão principal, “o que é a justiça (dikaiosine)?”,
é apresentada no Livro I e debatida no decorrer dos livros II, III e IV quando,
finalmente, Sócrates consegue apresentar uma conceituação e define a questão.
- Estudo do
Livro I
Conforme ressaltado anteriormente, o Livro I da República é um Diálogo de
Primeira Época. Nele Sócrates usa o método Elenchos
[2], método
investigativo-filosófico que visa, através do uso da Epagogé e do Silogismo em discursos braquiológicos [3],
avaliar as condições de verdade das definições apresentadas pelos
interlocutores a quem Sócrates questiona. Não caberá aqui analisar todas as
definições e refutações do diálogo, mas sim o percurso geral, apontando o
método socrático.
Embora neste diálogo não se consiga chegar a uma definição sobre o
conceito de justiça, sendo assim um diálogo aporético, são abordadas outras
questões paralelas ao tema. Isto porque Trasímaco [4] intervirá
no debate hostilizando Sócrates e acabará por desviar a questão central do
diálogo para outros temas, quais sejam, saber a utilidade da Justiça, se seria
mais vantajoso para o homem ser justo ou injusto e se seria a justiça um vício
ignorante ou uma virtude. Na verdade, Trasímaco associa a questão da justiça
com uma certa noção de eudaimonia[5] ,
uma vez que sopesa se o exercício da justiça faz com que o homem seja ou não
feliz.
A manifesta obstinação de Trasímaco em não ser refutado, fazendo
constantes ressalvas às suas definições, colocando-se de modo intimidativo no
debate e não sendo fiel à sua própria opinião (fator sine qua non para a dialética socrática), demonstra bem a concepção
erística[6] do
sofista, tão criticada por Platão/Sócrates (qual insiste em evidenciar as
diferenças entre a dialética socrática e a sofistica) e, posteriormente,
severamente repreendida por Aristóteles no Organon.
No início, Sócrates retornava de Pireu [7] na
companhia de Gláucon [8],
onde havia prestigiado festividades religiosas quando foi convidado por
Polemarco, filho de Céfalo [9], a
hospedar-se em sua casa para que pudesse prestigiar os eventos daquela
festividade que aconteceriam durante a noite. Aceito o convite, chegando à casa
de Polemarco, Sócrates se encontra com Céfalo, cuja velhice já é patente.
Céfalo, como é de costume dos velhos, queixa-se das poucas visitas de Sócrates
e passa a falar das experiências de ser um velho. Queixa-se de seus temores com
relação à morte em razão das crenças populares de que na morte o homem é
forçado a reparar suas injustiças praticadas em vida, submetendo-se à justiça
do Hades.[10]
A abordagem a respeito da justiça,
enseja Sócrates a colocar a questão sobre o conceito de justiça. Céfalo
apresenta uma primeira definição da justiça, sintetizada por Sócrates:
“(...) ela consiste na verdade e em restituir aquilo que se tomou de
alguém.” (Platão, A República, Livro
I, 331 c)
Esta
definição é rapidamente refutada por Sócrates através de uma pequena Epagogé, onde deu-se o exemplo de um
amigo de quem se recebe armas e posteriormente, quando fosse restituir-lhe,
estivesse tal amigo tomado por loucura, caso em que não é justo restituir-lhe
do bem, tampouco revelar-lhe toda a verdade.
Céfalo abandona a discussão em razão
de deveres religiosos e Polemarco se oferece para “herdar” o debate. “Herdando”
a discussão, Polemarco tenta explicar o conceito de restituir o que se deve de
forma justa, conforme o ditado de Simónides [11],
como sendo fazer o bem aos amigos e aos inimigos o mal. Sócrates extrai essa
premissa de Polemarco através de uma Epagogé,
onde aplica o conceito, de restituir o que a cada um convém, em situações
como na medicina que convém dar remédios, comida e bebida aos corpos e na
culinária que deve dar aos alimentos os corretos temperos. Segue esta linha de raciocínio
até que chega-se à questão: a que deve-se dar o que é devido na arte da justiça?
Polemarco dá a seguinte premissa para a Epagogé:
“(...) dá ajuda aos amigos e prejuízo aos inimigos.” (Platão, A República. 332d)
Posto que a Justiça não poderá ser
causar mal a outrem, Sócrates refuta também essa premissa, enaltecendo a
Justiça, quando é interpelado por Trasímaco, qual busca levar a questão da
justiça para o âmbito do Estado, afirmando que a mesma não é mais do que a
conveniência do mais forte, a conveniência do governante sobre o súdito, que a
injustiça é mais proveitosa do que a justiça e que a justiça é uma ingenuidade
ao passo que injustiça sim é prudência.
Sócrates argumentará do contrário,
tentando demonstrar que a injustiça causa o ódio e revoltas entre os Estados, o
que é um mal, a ponto que o refutará adiante, mas contudo sem chegarem à uma
conclusão para nenhuma das questões apresentadas. O diálogo termina em assim em
aporia, com todos os partícipes pouco satisfeitos com o nível de persuasão até
então apresentado, insatisfação que ensejará uma nova empreita no livro II,
conforme será visto.
- Estudo do
Livro II
Insatisfeito com a retirada de Trasímaco e, consequentemente, com o
resultado do diálogo contido no Livro I, Gláucon insiste em continuar a
discussão acerca da justiça, retomando a investigação sobre seu conceito.
Inconformado com a forte corrente
de pensamento adotada por sofistas e até mesmo por populares, qual enaltece a
injustiça, colocando-a como um bem realmente mais vantajoso para o indivíduo em
contra-senso à justiça, qual seria um bem mais penoso que se pratica por causa
das aparências, da reputação e vantagem que a boa fama de justo traz, mas que
por si mesma é bem dificultosa, Gláucon passa a desempenhar o papel de advocatus diaboli demonstrando à
Sócrates a força de tal corrente de pensamento, a fim de incitá-lo a
persuadi-lo do contrário, provando que a justiça é um bem e a injustiça um
vício. Trabalho que Sócrates então passará a desenvolver.
A partir daí, verifica-se claramente a filosofia platônica, que passará a
usar sua concepção de alma e a relação desta com a Pólis para o empreendimento que fará no decorrer dos próximos livros
a serem analisados.
A concepção de alma em Platão, sem dúvida, de origem pitagórica e órfica,
é um conceito-chave de sua filosofia. É o grande princípio das questões éticas,
ontológicas, cosmológicas e epistemológicas. Ela tem a função de mediação entre
as coisas sensíveis e o mundo inteligível. A alma em Platão explica como
funciona o cosmos e a pólis, sendo
esta última uma extensão do indivíduo e sendo o indivíduo em si uma
"cidade" e um “micro-cosmos”. A divisão tripartida da alma do
indivíduo é levada para a cidade idealizada, criando-se assim uma espécie de
"alma da cidade" nos mesmos moldes da alma humana, e essa relação
será usada como um "filtro" para verificar se as condições de verdade
referentes ao tema da justiça aplicadas sob a ótica "macro" com
relação à pólis serão também cabíveis
sob a ótica “micro” da esfera individual. Conforme bem salienta Emília Maria
Mendonça de Morais [12],
a República é a obra que melhor demonstra o profundo esforço de Platão para
integrar os dois domínios da vida filosófica legados pela tradição pitagórica:
o ético-político e o teorético, onde a pólis
ressurge como objeto primordial tanto para a ciência como para a filosofia. Para
melhor entender, indispensável transcrever alguns trechos do texto deste
momento onde o personagem Sócrates expõe a metáfora dessa ótica “macro”, usando
da relação cidade/indivíduo, com a qual pretende desenvolver sua tese:
“(...) devemos conduzir a investigação da mesma forma que o faríamos, se
alguém mandasse ler de longe letras pequenas a pessoas de vista fraca, e então
alguma delas desse conta de que existiam as mesmas letras em qualquer outra
parte, em tamanho maior e numa escala mais ampla. (...) depois de lerem
primeiro estas, pudessem então observar as menores, a ver se eram a mesma
coisa. (...) talvez exista uma justiça numa escala mais ampla, e mais fácil de
apreender. Se quiserdes então, investigaremos primeiro qual a sua natureza nas
cidades. Quando tivermos feito essa indagação, executá-la-emos em relação ao
indivíduo, observando a semelhança com o maior na forma do menor.” ( PLATÃO.
In: A República. 368 d – 369 a ).
A referida divisão da Alma em três
partes distintas na concepção de Platão se dá da seguinte maneira:
a) Alma Concupiscível: Parte da alma responsável pelos desejos inatos,
extintivos e pelo anelo de prazeres sensuais, glutônicos, etc.
b) Alma Irascível: Parte da alma
responsável pela defesa do indivíduo, pelo ímpeto.
c) Alma racional: Parte da qual se subordina as outras duas. Conforme o
próprio nome já diz, é parte responsável pelo domínio da razão.
Da mesma forma Platão divide a
sistematização da cidade, com a seguinte analogia:
a)
Governantes: Parte análoga à Alma Racional.
b)
Guardiões ou Guerreiros: Parte análoga à Alma Irascível
c)
Artesãos, comerciantes, povo em geral: Parte análoga à
Alma Concupiscível.
Esclarecida esta concepção platônica, observar-se-á a desenvoltura da
metodologia do Sócrates platônico no diálogo.
Aceito pelos interlocutores, Polemarco e Adimanto, esta analogia,
Sócrates passa a desenvolver as interrogações, que, embora de forma bem
semelhante à Epagogé, usando de
exemplificações que conduzem os interlocutores à compreensão, apresenta
flagrantes diferença dos diálogos de primeira época, onde o Elenchos era usado por Sócrates apenas
para investigar sobre o real conhecimento do interrogado, sem nenhuma
pretensão, por parte de Sócrates, de expor ou desenvolver suas idéias ou
conhecimentos, uma vez que lá naqueles textos, Sócrates se apresentava como um
completo ignorante, cujo único conhecimento que alegava ter era a consciência
de sua própria ignorância.
Diferentemente, no livro ora analisado, Sócrates, surpreendentemente,
passa a empreender em conjunto com os interlocutores a desenvoltura de uma
tese, de uma asserção, produzindo um conhecimento que antes afirmava ser
incapaz de exercitar.
O que mais chama a atenção sobre o Sócrates Platônico, é que, ao usar a Epagogé, ele próprio constrói uma
premissa. Sua Epagogé conduz o
raciocínio do interlocutor não para que aquele apresente uma premissa como
ocorre nos diálogos da Primeira Época, e
sim para que se compreenda a premissa que o próprio Sócrates apresentará.
Assim, o livro II é um projeto do que será desenvolvido posteriormente
nos próximos livros, é o início do pensamento platônico na obra e, para tal
empreita, usando da analogia alma/cidade, o personagem Sócrates iniciará a
fundação de uma cidade imaginária a fim de buscar descobrir nela a aplicação e
a definição universal da justiça, de forma que possa se encaixar desde a esfera
individual até a cósmica.
Busca-se primeiramente, compreender as origens da cidade, as causas que
motivam sua fundação, tais como a necessidade humana de tantos objetos que
ensejam os meios de produção e o comércio. Quando dessa abordagem já é possível
observar no texto que a população em geral, que cuida dos meios de produção e
do comércio (que aqui se incluí tanto força de trabalho quanto o proprietário
dos meios, tudo é uma só classe) são aqueles que cuidam das “necessidades” de
consumo da cidade, de seus apetites necessários e naturais, tal como a alma
concupiscível.
Posteriormente, da abordagem anterior surge, consequentemente, a
necessidade de se discorrer a acerca da segurança da cidade, e partir daí é
formulada a necessidade de uma classe especializada de guardiões, um exército por
excelência. [13] Empenhando-se
nesta análise, conclui-se que esta força armada especializada, além de
imprescindivelmente contar com profissionais com disposição natural para o
desempenho das atividades militares, deverão ainda receber uma educação
específica onde cultivariam tanto exercícios intelectuais quanto físicos para
que sejam capazes de, ao mesmo tempo, serem impetuosos e destemidos frente o
combate ao inimigo e ser dócil e pacato para com seus concidadãos. Do mesmo
modo que na abordagem anterior é possível identificar a similaridade do da
classe produtiva ou artesã com o perfil da alma concupiscível, é possível na
abordagem a respeito da classe guerreira, reconhecer a similaridade desta com a
silhueta da alma irascível.
Nesta abordagem se finda o livro II.
- Estudo do
Livro III
O livro III é a continuação do desenvolvimento da educação dos guardiões,
cuja análise, embora extremamente rica sob diversos aspectos, é quase
irrelevante para o presente trabalho, posto que o objetivo do mesmo, conforme
observado na Introdução, é voltado para a análise dos métodos
investigativo-filosóficos, a fim de explicar os princípios e a forma da
filosofia platônica e evidenciar suas diferenças com a filosofia socrática
contida no livro I. No livro III a analogia da classe guardiã ideal com a alma
Irascível se aclara ainda mais e fica evidente que este guardião ideal deverá
possuir, além da capacidade guerreira, um traço de filósofo, vez que deverá ser
capaz de distinguir o bem do mal.
Assim, serão aqui ressaltados apenas alguns pontos do texto observados,
que são dignos de um trabalho específico, tais como: a idéia de censura que
aparece com a idéia de proibir a divulgação de mitos e crenças religiosas que
ensejem medo da vida pós-morte ou que enfraqueçam a sensibilidade emocional dos
guardiões, nisto se inclui a mimese, cujo conteúdo e protagonista também serão
regulados; há uma observação em 389c bem polêmica que legitima ao governante
mentir; que a concepção de moderação e simplicidade do guardião que seria
privado de obter riquezas e propriedades, cuja subsistência seria custeada pelo
Estado; a posição utilitarista da vida humana, que seria descartada, seja de
criança, jovem ou velho, no caso de se tornar permanentemente incapaz; Uma
curiosidade é a relação feita entre alimentação adequada e saúde já naquele
período.
5.Estudo do Livro IV
Com o Livro IV chega ao fim a parte da obra dedicada ao questionamento
acerca da justiça. Fosse interessante ainda para a melhor observação da alma
racional na figura do governante um estudo sobre o livro VI da República, é
perfeitamente possível já observar aqui no livro IV, onde a função da alma
racional que, vendo a cidade dentro da analogia proposta, só poderia ser
desenvolvida plenamente pelos governantes.
Isso porque conclui-se que no homem justo, ainda, predomina a razão. A
razão, quando domina a coragem, modera os desejos e prazeres, fazendo com que o
homem mantenha o controle de si mesmo, e assim é a cidade nesta analogia, o
governante sendo aquele que domina a razão será moderador dos desejos e
prazeres e assim educador de toda a população, fazendo que cada um cumpra sua
função da melhor forma possível sem prejudicar outro setor. Vale à pena trazer
à tona as seguintes palavras de Sócrates:
“um homem é justo na medida em que suas faculdades
cumprem suas funções, e ele sua tarefa” (441d)
É importante observar, que aquele que é justo não só tem suas faculdades
atuando em harmonia sob o domínio da razão como, ele próprio, realiza dentro da
cidade unicamente a função que lhe cabe por natureza, sem interferir no que não
lhe diz respeito.
Nessa esteira se define a Justiça: É cada um cumprir a sua faculdade
dentro desse método que o personagem Sócrates tem em mente, ou seja, se a
justiça é uma virtude, é ao examinar o homem que a revelaremos em nível
individual. Mas sendo a cidade uma extensão dos homens, possui estruturas análogas
por meio das quais se pode chegar com mais facilidade a contemplar a justiça
dentro de cada um dos homens que a compõe. Sendo que um homem justo é
semelhante a uma cidade justa, se nessa cidade a justiça é dada pela harmonia
entre suas classes; no homem, a justiça é dada, de modo semelhante, pela
harmonia entre suas faculdades, a saber, razão, ímpeto e coragem. Portanto, uma
cidade justa é aquela na qual cada classe exerce unicamente a função que lhe
cabe sem interferir nas demais.
Nas palavras de Averroes, sob tradução de Miguel Cruz Hernandes[14]:
“(...) así cada uno podrá ejercer la actitud acorde con su naturaleza y
no se entretendrá en lo que no le corresponde. De este modo, dicha sociedad
poseerá uma estructura interna justa, porque em ella la equidad consistirá ante
todo en que cada uno de sus ciudadanos haga tan solo aquello para lo cual está
dotado.” (Averroes, 1996, pág. 52)
- Conclusão
Cumprido o objetivo do presente trabalho, aclara-se a distinção entre a
filosofia Socrática e a filosofia Platônica. Uma que produz o apontamento do
falso saber sem, contudo, pretender produzir um saber verdadeiro e outra, uma
filosofia positiva, que apresenta um discurso argumentativo na tentativa de se
gerar e defender uma tese, em produzir um conhecimento. Apercebe-se a concepção
platônica da alma, cuja organização é análoga à do cosmos e à da Polis, uma tese usada como ponto de
partida da investigação, algo impensável no Sócrates Histórico, que não tinha
tese nenhuma a não ser a de que possuía uma missão divina de conscientizar
todos de sua ignorância, tal como ele mesmo tinha consciência da sua.
Pôde-se ainda concluir que a justiça advém da temperança dos que governam
sobre os governados, educando corretamente e fazendo com cada um cumpra unicamente
a função para qual é dada sua natureza sem interferir nas demais, gerando
harmonia no todo, conceito de justiça que se aplica ao indivíduo e ao cosmos.
Bibliografia
PLATÃO. A República. 10ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2007.
AVERROES. Exposición de la República de Platón,
Madrid, 1986.
MORAIS, Emília Maria de Mendonça. In: “Justiça e Ontologia:
a dialética do ser e do parecer n’Á República”.
[1] -
A tradição acadêmica da História da Filosofia Antiga classificou os diálogos de
Sócrates escritos por Platão em três categorias distintas, quais sejam:
Diálogos de Primeira, Segunda e Terceira Épocas. Esta classificação não se
refere à cronologia em que tais diálogos foram redigidos, e sim em razão das
diferenças nos métodos empregados nas investigações filosóficas e também nas
diferentes posturas adotadas por Sócrates em cada um dos diálogos. Os Diálogos
de Primeira Época ou Diálogos do Sócrates Histórico, são admitidos por aquela
tradição acadêmica como sendo diálogos genuinamente de Sócrates, enquanto os
Diálogos de Terceira Época, são admitidos como diálogos de Platão, onde
Sócrates torna-se apenas um personagem literário de Platão. Os diálogos de
Segunda Época, ou Diálogos de Transição, são aqueles cujos métodos e posturas
de Sócrates se misturam e, por isso, a História da Filosofia não conseguiu
autenticar os diálogos como sendo Platônicos ou Socráticos. Teria sido o alemão
Karl Friedrich Hermann (1804-1855), renomado professor de filosofia do século
XIX, o primeiro a reconhecer uma fase “socrática” na obra de Platão. Seu
entendimento se fortaleceu com a publicação de “ Sofista” e “Político”
em 1867, por Lewis Campbel (1830-1908), professor de Grego da Universidade St.
Andrews. Assim, no final do século XIX, com a vinda da estilometria
desenvolvida pelos professores Dittenberger e Constantin Ritter, a obra de
Platão passou ser dividida nas três fases distintas acima explicitadas.
[2] -
O método Elenchos foi objeto do
estudo anterior “A Aplicação do Elenchos
Socrático no Diálogo Laques ” (LEITE, Léo Demétrius Lassi Dias da Mota.
2008), onde foi detalhadamente analisado.
[3] -
o discurso braquiológico é aquele que contém brevidade na expressão verbal. É
objetivo, sem afetamentos ou ornamentos de oratória.
[4] -
Trasímaco era um conhecido Sofista.
[5] -
A tradução mais aceita para a palavra eudaimonia
é o conceito de felicidade.
[6] -
Na antiguidade grega, erística era a arte ou a técnica da disputa argumentativa
no debate, desenvolvida, sobretudo, pelos sofistas, e baseada em habilidade
verbal e acuidade de raciocínio. Em Platão e também em Aristóteles, é a
argumentação que, buscando unicamente a vitória em um debate, abandona qualquer
preocupação com a verdade.
[7] -
Pireu era uma demo portuária de
Atenas acerca de 6 km
da cidade, qual, hodiernamente, é parte da região metropolitana da capital
grega.
[8] -
Irmão de Platão e de Adimanto, todos filhos de Aríston.
[9] - Amigo longevo de Sócrates.
[10] -
Na cultura helênica, Hades é a dimensão para onde vão os mortos. O local é
governado pelo deus também chamado de Hades e pela rainha Perséfone.
[11] -
Poeta grego
[12]
MORAIS, Emília Maria de Mendonça. In: “Justiça
e Ontologia: a dialética do ser e do parecer n’Á República”.
[13] -
Cumpre observar que idealizar um exercito propriamente dito, uma força armada
institucionalizada e pertencente ao Estado é, até então, uma inovação, posto
que no mundo helênico os cidadãos civis compunham as fileiras militares e combatiam nas guerras. Do mesmo modo a
estrutura bélica era fomentada pela iniciativa privada e não pelo tesouro
público.
[14] -
Trata-se da obra “La
Exposicion de la
República de Platón, uma tradução de Miguel Cruz Hernandes
para o Espanhol da obra de AVERROES, Abu-L-Walid Ibn Rusd, cujo título original
é Taljis Kitab al-Siyasat Aflatun