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quarta-feira, 18 de abril de 2012

A República (Platão) Estudo dos 04 Primeiros Livros. Investigação do Conceito de Justiça.

 


        Na Primavera de 2008 fiz a leitura dos quatro primeiros livros da obra de Platão, A República. Nestes, o tema perseguido nos diálogos, em síntese, é a conceituação da Justiça. No entanto passa-se por diversos e importantes temas sobre educação, eugenia, eutanásia, formação do exército, dentre outros. 

          Hoje disponibilizo aqui o trabalho que realizei de estudos a respeito do livros supracitados, no qual abordo os métodos de investigação filosófica contidos nos mesmos. Uma resenha que poderá auxiliar bastante a todos os que se interessam pelo estudo dos textos de Platão. Antes, porém, indico a leitura do texto neste blog publicado sobre a leitura do diálogo Laques, também de Platão, onde, além de uma análise mais profunda sobre o método Elenchos, são analisadas algumas questões introdutórias nos diálogos em que Sócrates aparece, tais como o chamado "Problema de Sócrates", conhecimento necessário à compreensão das diversas facetas do personagem.

            Desde já peço desculpas por eventuais erros gramaticais, uma vez que não revisei o texto antes de postar devido a ausência de tempo para o mesmo.

             Boa leitura! 


  1. Introdução

A República de Platão é uma obra composta por dez livros, cujos temas envolvem questões sobre teoria e ordem política e social que se preocupa, em última instância, com a educação, do povo, dos guardiões e, sobretudo, do governante ideal, o Rei-Filósofo. Os livros são redigidos na forma de diálogos e narrados em primeira pessoa por Sócrates, que quase sempre é um dos interlocutores dos diálogos. O Título é latinizado, república origina-se do latim res publica que significa bem público.

O objeto deste trabalho se resume à análise dos quatro primeiros livros, quais buscam uma conceituação do que é a justiça. O objetivo é analisar o método empregado na investigação filosófica em cada um dos quatro livros, quais envolvem métodos considerados ora genuinamente socráticos, ora genuinamente platônicos, posto que, é pacífico na tradição acadêmica da História da Filosofia Antiga, que o livro I é um diálogo de Primeira Época, enquanto os outros se classificam com sendo diálogos de Terceira Época. [1]

      Muito já se questionou a respeito das razões que levaram Platão a usar o diálogo de Primeira Época contido no Livro I como prelúdio da República, uma das principais obras de sua filosofia. A resposta mais aceita é que sua intenção foi evidenciar as limitações da filosofia socrática, que refuta o falso conhecimento, mas não avança na investigação, resultando sempre em aporia.

A questão principal, “o que é a justiça (dikaiosine)?”, é apresentada no Livro I e debatida no decorrer dos livros II, III e IV quando, finalmente, Sócrates consegue apresentar uma conceituação e define a questão.


  1. Estudo do Livro I

Conforme ressaltado anteriormente, o Livro I da República é um Diálogo de Primeira Época. Nele Sócrates usa o método Elenchos [2], método investigativo-filosófico que visa, através do uso da Epagogé e do Silogismo em discursos braquiológicos [3], avaliar as condições de verdade das definições apresentadas pelos interlocutores a quem Sócrates questiona. Não caberá aqui analisar todas as definições e refutações do diálogo, mas sim o percurso geral, apontando o método socrático.

Embora neste diálogo não se consiga chegar a uma definição sobre o conceito de justiça, sendo assim um diálogo aporético, são abordadas outras questões paralelas ao tema. Isto porque Trasímaco [4] intervirá no debate hostilizando Sócrates e acabará por desviar a questão central do diálogo para outros temas, quais sejam, saber a utilidade da Justiça, se seria mais vantajoso para o homem ser justo ou injusto e se seria a justiça um vício ignorante ou uma virtude. Na verdade, Trasímaco associa a questão da justiça com uma certa noção de eudaimonia[5] , uma vez que sopesa se o exercício da justiça faz com que o homem seja ou não feliz.

A manifesta obstinação de Trasímaco em não ser refutado, fazendo constantes ressalvas às suas definições, colocando-se de modo intimidativo no debate e não sendo fiel à sua própria opinião (fator sine qua non para a dialética socrática), demonstra bem a concepção erística[6] do sofista, tão criticada por Platão/Sócrates (qual insiste em evidenciar as diferenças entre a dialética socrática e a sofistica) e, posteriormente, severamente repreendida por Aristóteles no Organon.

No início, Sócrates retornava de Pireu [7] na companhia de Gláucon [8], onde havia prestigiado festividades religiosas quando foi convidado por Polemarco, filho de Céfalo [9], a hospedar-se em sua casa para que pudesse prestigiar os eventos daquela festividade que aconteceriam durante a noite. Aceito o convite, chegando à casa de Polemarco, Sócrates se encontra com Céfalo, cuja velhice já é patente. Céfalo, como é de costume dos velhos, queixa-se das poucas visitas de Sócrates e passa a falar das experiências de ser um velho. Queixa-se de seus temores com relação à morte em razão das crenças populares de que na morte o homem é forçado a reparar suas injustiças praticadas em vida, submetendo-se à justiça do Hades.[10]

            A abordagem a respeito da justiça, enseja Sócrates a colocar a questão sobre o conceito de justiça. Céfalo apresenta uma primeira definição da justiça, sintetizada por Sócrates:

“(...) ela consiste na verdade e em restituir aquilo que se tomou de alguém.” (Platão, A República, Livro I, 331 c)

            Esta definição é rapidamente refutada por Sócrates através de uma pequena Epagogé, onde deu-se o exemplo de um amigo de quem se recebe armas e posteriormente, quando fosse restituir-lhe, estivesse tal amigo tomado por loucura, caso em que não é justo restituir-lhe do bem, tampouco revelar-lhe toda a verdade.

            Céfalo abandona a discussão em razão de deveres religiosos e Polemarco se oferece para “herdar” o debate. “Herdando” a discussão, Polemarco tenta explicar o conceito de restituir o que se deve de forma justa, conforme o ditado de Simónides [11], como sendo fazer o bem aos amigos e aos inimigos o mal. Sócrates extrai essa premissa de Polemarco através de uma Epagogé, onde aplica o conceito, de restituir o que a cada um convém, em situações como na medicina que convém dar remédios, comida e bebida aos corpos e na culinária que deve dar aos alimentos os corretos temperos. Segue esta linha de raciocínio até que chega-se à questão: a que deve-se dar o que é devido na arte da justiça? Polemarco dá a seguinte premissa para a Epagogé:

“(...) dá ajuda aos amigos e prejuízo aos inimigos.” (Platão, A República. 332d)
            Posto que a Justiça não poderá ser causar mal a outrem, Sócrates refuta também essa premissa, enaltecendo a Justiça, quando é interpelado por Trasímaco, qual busca levar a questão da justiça para o âmbito do Estado, afirmando que a mesma não é mais do que a conveniência do mais forte, a conveniência do governante sobre o súdito, que a injustiça é mais proveitosa do que a justiça e que a justiça é uma ingenuidade ao passo que injustiça sim é prudência.

            Sócrates argumentará do contrário, tentando demonstrar que a injustiça causa o ódio e revoltas entre os Estados, o que é um mal, a ponto que o refutará adiante, mas contudo sem chegarem à uma conclusão para nenhuma das questões apresentadas. O diálogo termina em assim em aporia, com todos os partícipes pouco satisfeitos com o nível de persuasão até então apresentado, insatisfação que ensejará uma nova empreita no livro II, conforme será visto.

  1. Estudo do Livro II

Insatisfeito com a retirada de Trasímaco e, consequentemente, com o resultado do diálogo contido no Livro I, Gláucon insiste em continuar a discussão acerca da justiça, retomando a investigação sobre seu conceito.

 Inconformado com a forte corrente de pensamento adotada por sofistas e até mesmo por populares, qual enaltece a injustiça, colocando-a como um bem realmente mais vantajoso para o indivíduo em contra-senso à justiça, qual seria um bem mais penoso que se pratica por causa das aparências, da reputação e vantagem que a boa fama de justo traz, mas que por si mesma é bem dificultosa, Gláucon passa a desempenhar o papel de advocatus diaboli demonstrando à Sócrates a força de tal corrente de pensamento, a fim de incitá-lo a persuadi-lo do contrário, provando que a justiça é um bem e a injustiça um vício. Trabalho que Sócrates então passará a desenvolver.

A partir daí, verifica-se claramente a filosofia platônica, que passará a usar sua concepção de alma e a relação desta com a Pólis para o empreendimento que fará no decorrer dos próximos livros a serem analisados.

A concepção de alma em Platão, sem dúvida, de origem pitagórica e órfica, é um conceito-chave de sua filosofia. É o grande princípio das questões éticas, ontológicas, cosmológicas e epistemológicas. Ela tem a função de mediação entre as coisas sensíveis e o mundo inteligível. A alma em Platão explica como funciona o cosmos e a pólis, sendo esta última uma extensão do indivíduo e sendo o indivíduo em si uma "cidade" e um “micro-cosmos”. A divisão tripartida da alma do indivíduo é levada para a cidade idealizada, criando-se assim uma espécie de "alma da cidade" nos mesmos moldes da alma humana, e essa relação será usada como um "filtro" para verificar se as condições de verdade referentes ao tema da justiça aplicadas sob a ótica "macro" com relação à pólis serão também cabíveis sob a ótica “micro” da esfera individual. Conforme bem salienta Emília Maria Mendonça de Morais [12], a República é a obra que melhor demonstra o profundo esforço de Platão para integrar os dois domínios da vida filosófica legados pela tradição pitagórica: o ético-político e o teorético, onde a pólis ressurge como objeto primordial tanto para a ciência como para a filosofia. Para melhor entender, indispensável transcrever alguns trechos do texto deste momento onde o personagem Sócrates expõe a metáfora dessa ótica “macro”, usando da relação cidade/indivíduo, com a qual pretende desenvolver sua tese:

“(...) devemos conduzir a investigação da mesma forma que o faríamos, se alguém mandasse ler de longe letras pequenas a pessoas de vista fraca, e então alguma delas desse conta de que existiam as mesmas letras em qualquer outra parte, em tamanho maior e numa escala mais ampla. (...) depois de lerem primeiro estas, pudessem então observar as menores, a ver se eram a mesma coisa. (...) talvez exista uma justiça numa escala mais ampla, e mais fácil de apreender. Se quiserdes então, investigaremos primeiro qual a sua natureza nas cidades. Quando tivermos feito essa indagação, executá-la-emos em relação ao indivíduo, observando a semelhança com o maior na forma do menor.” ( PLATÃO. In: A República. 368 d – 369 a).

            A referida divisão da Alma em três partes distintas na concepção de Platão se dá da seguinte maneira:
a) Alma Concupiscível: Parte da alma responsável pelos desejos inatos, extintivos e pelo anelo de prazeres sensuais, glutônicos, etc.
            b) Alma Irascível: Parte da alma responsável pela defesa do indivíduo, pelo ímpeto.
c) Alma racional: Parte da qual se subordina as outras duas. Conforme o próprio nome já diz, é parte responsável pelo domínio da razão.

            Da mesma forma Platão divide a sistematização da cidade, com a seguinte analogia:
a)      Governantes: Parte análoga à Alma Racional.
b)      Guardiões ou Guerreiros: Parte análoga à Alma Irascível
c)      Artesãos, comerciantes, povo em geral: Parte análoga à Alma Concupiscível.

Esclarecida esta concepção platônica, observar-se-á a desenvoltura da metodologia do Sócrates platônico no diálogo.

Aceito pelos interlocutores, Polemarco e Adimanto, esta analogia, Sócrates passa a desenvolver as interrogações, que, embora de forma bem semelhante à Epagogé, usando de exemplificações que conduzem os interlocutores à compreensão, apresenta flagrantes diferença dos diálogos de primeira época, onde o Elenchos era usado por Sócrates apenas para investigar sobre o real conhecimento do interrogado, sem nenhuma pretensão, por parte de Sócrates, de expor ou desenvolver suas idéias ou conhecimentos, uma vez que lá naqueles textos, Sócrates se apresentava como um completo ignorante, cujo único conhecimento que alegava ter era a consciência de sua própria ignorância.

Diferentemente, no livro ora analisado, Sócrates, surpreendentemente, passa a empreender em conjunto com os interlocutores a desenvoltura de uma tese, de uma asserção, produzindo um conhecimento que antes afirmava ser incapaz de exercitar.

O que mais chama a atenção sobre o Sócrates Platônico, é que, ao usar a Epagogé, ele próprio constrói uma premissa. Sua Epagogé conduz o raciocínio do interlocutor não para que aquele apresente uma premissa como ocorre nos diálogos da Primeira Época, e sim para que se compreenda a premissa que o próprio Sócrates apresentará. 

Assim, o livro II é um projeto do que será desenvolvido posteriormente nos próximos livros, é o início do pensamento platônico na obra e, para tal empreita, usando da analogia alma/cidade, o personagem Sócrates iniciará a fundação de uma cidade imaginária a fim de buscar descobrir nela a aplicação e a definição universal da justiça, de forma que possa se encaixar desde a esfera individual até a cósmica. 

Busca-se primeiramente, compreender as origens da cidade, as causas que motivam sua fundação, tais como a necessidade humana de tantos objetos que ensejam os meios de produção e o comércio. Quando dessa abordagem já é possível observar no texto que a população em geral, que cuida dos meios de produção e do comércio (que aqui se incluí tanto força de trabalho quanto o proprietário dos meios, tudo é uma só classe) são aqueles que cuidam das “necessidades” de consumo da cidade, de seus apetites necessários e naturais, tal como a alma concupiscível.

Posteriormente, da abordagem anterior surge, consequentemente, a necessidade de se discorrer a acerca da segurança da cidade, e partir daí é formulada a necessidade de uma classe especializada de guardiões, um exército por excelência. [13] Empenhando-se nesta análise, conclui-se que esta força armada especializada, além de imprescindivelmente contar com profissionais com disposição natural para o desempenho das atividades militares, deverão ainda receber uma educação específica onde cultivariam tanto exercícios intelectuais quanto físicos para que sejam capazes de, ao mesmo tempo, serem impetuosos e destemidos frente o combate ao inimigo e ser dócil e pacato para com seus concidadãos. Do mesmo modo que na abordagem anterior é possível identificar a similaridade do da classe produtiva ou artesã com o perfil da alma concupiscível, é possível na abordagem a respeito da classe guerreira, reconhecer a similaridade desta com a silhueta da alma irascível.
Nesta abordagem se finda o livro II.

  1. Estudo do Livro III

O livro III é a continuação do desenvolvimento da educação dos guardiões, cuja análise, embora extremamente rica sob diversos aspectos, é quase irrelevante para o presente trabalho, posto que o objetivo do mesmo, conforme observado na Introdução, é voltado para a análise dos métodos investigativo-filosóficos, a fim de explicar os princípios e a forma da filosofia platônica e evidenciar suas diferenças com a filosofia socrática contida no livro I. No livro III a analogia da classe guardiã ideal com a alma Irascível se aclara ainda mais e fica evidente que este guardião ideal deverá possuir, além da capacidade guerreira, um traço de filósofo, vez que deverá ser capaz de distinguir o bem do mal. 
Assim, serão aqui ressaltados apenas alguns pontos do texto observados, que são dignos de um trabalho específico, tais como: a idéia de censura que aparece com a idéia de proibir a divulgação de mitos e crenças religiosas que ensejem medo da vida pós-morte ou que enfraqueçam a sensibilidade emocional dos guardiões, nisto se inclui a mimese, cujo conteúdo e protagonista também serão regulados; há uma observação em 389c bem polêmica que legitima ao governante mentir; que a concepção de moderação e simplicidade do guardião que seria privado de obter riquezas e propriedades, cuja subsistência seria custeada pelo Estado; a posição utilitarista da vida humana, que seria descartada, seja de criança, jovem ou velho, no caso de se tornar permanentemente incapaz; Uma curiosidade é a relação feita entre alimentação adequada e saúde já naquele período.


5.Estudo do Livro IV

Com o Livro IV chega ao fim a parte da obra dedicada ao questionamento acerca da justiça. Fosse interessante ainda para a melhor observação da alma racional na figura do governante um estudo sobre o livro VI da República, é perfeitamente possível já observar aqui no livro IV, onde a função da alma racional que, vendo a cidade dentro da analogia proposta, só poderia ser desenvolvida plenamente pelos governantes.

Isso porque conclui-se que no homem justo, ainda, predomina a razão. A razão, quando domina a coragem, modera os desejos e prazeres, fazendo com que o homem mantenha o controle de si mesmo, e assim é a cidade nesta analogia, o governante sendo aquele que domina a razão será moderador dos desejos e prazeres e assim educador de toda a população, fazendo que cada um cumpra sua função da melhor forma possível sem prejudicar outro setor. Vale à pena trazer à tona as seguintes palavras de Sócrates:

“um homem é justo na medida em que suas faculdades cumprem suas funções, e ele sua tarefa” (441d)

É importante observar, que aquele que é justo não só tem suas faculdades atuando em harmonia sob o domínio da razão como, ele próprio, realiza dentro da cidade unicamente a função que lhe cabe por natureza, sem interferir no que não lhe diz respeito.

Nessa esteira se define a Justiça: É cada um cumprir a sua faculdade dentro desse método que o personagem Sócrates tem em mente, ou seja, se a justiça é uma virtude, é ao examinar o homem que a revelaremos em nível individual. Mas sendo a cidade uma extensão dos homens, possui estruturas análogas por meio das quais se pode chegar com mais facilidade a contemplar a justiça dentro de cada um dos homens que a compõe. Sendo que um homem justo é semelhante a uma cidade justa, se nessa cidade a justiça é dada pela harmonia entre suas classes; no homem, a justiça é dada, de modo semelhante, pela harmonia entre suas faculdades, a saber, razão, ímpeto e coragem. Portanto, uma cidade justa é aquela na qual cada classe exerce unicamente a função que lhe cabe sem interferir nas demais.

Nas palavras de Averroes, sob tradução de Miguel Cruz Hernandes[14]:

“(...) así cada uno podrá ejercer la actitud acorde con su naturaleza y no se entretendrá en lo que no le corresponde. De este modo, dicha sociedad poseerá uma estructura interna justa, porque em ella la equidad consistirá ante todo en que cada uno de sus ciudadanos haga tan solo aquello para lo cual está dotado.” (Averroes, 1996, pág. 52)

  1. Conclusão

Cumprido o objetivo do presente trabalho, aclara-se a distinção entre a filosofia Socrática e a filosofia Platônica. Uma que produz o apontamento do falso saber sem, contudo, pretender produzir um saber verdadeiro e outra, uma filosofia positiva, que apresenta um discurso argumentativo na tentativa de se gerar e defender uma tese, em produzir um conhecimento. Apercebe-se a concepção platônica da alma, cuja organização é análoga à do cosmos e à da Polis, uma tese usada como ponto de partida da investigação, algo impensável no Sócrates Histórico, que não tinha tese nenhuma a não ser a de que possuía uma missão divina de conscientizar todos de sua ignorância, tal como ele mesmo tinha consciência da sua.

Pôde-se ainda concluir que a justiça advém da temperança dos que governam sobre os governados, educando corretamente e fazendo com cada um cumpra unicamente a função para qual é dada sua natureza sem interferir nas demais, gerando harmonia no todo, conceito de justiça que se aplica ao indivíduo e ao cosmos.


Bibliografia

PLATÃO. A República. 10ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2007.

AVERROES. Exposición de la República de Platón, Madrid, 1986.

MORAIS, Emília Maria de Mendonça. In: “Justiça e Ontologia: a dialética do ser e do parecer n’Á República”.





[1] - A tradição acadêmica da História da Filosofia Antiga classificou os diálogos de Sócrates escritos por Platão em três categorias distintas, quais sejam: Diálogos de Primeira, Segunda e Terceira Épocas. Esta classificação não se refere à cronologia em que tais diálogos foram redigidos, e sim em razão das diferenças nos métodos empregados nas investigações filosóficas e também nas diferentes posturas adotadas por Sócrates em cada um dos diálogos. Os Diálogos de Primeira Época ou Diálogos do Sócrates Histórico, são admitidos por aquela tradição acadêmica como sendo diálogos genuinamente de Sócrates, enquanto os Diálogos de Terceira Época, são admitidos como diálogos de Platão, onde Sócrates torna-se apenas um personagem literário de Platão. Os diálogos de Segunda Época, ou Diálogos de Transição, são aqueles cujos métodos e posturas de Sócrates se misturam e, por isso, a História da Filosofia não conseguiu autenticar os diálogos como sendo Platônicos ou Socráticos. Teria sido o alemão Karl Friedrich Hermann (1804-1855), renomado professor de filosofia do século XIX, o primeiro a reconhecer uma fase “socrática” na obra de Platão. Seu entendimento se fortaleceu com a publicação de “ Sofista” e “Político” em 1867, por Lewis Campbel (1830-1908), professor de Grego da Universidade St. Andrews. Assim, no final do século XIX, com a vinda da estilometria desenvolvida pelos professores Dittenberger e Constantin Ritter, a obra de Platão passou ser dividida nas três fases distintas acima explicitadas.

[2] - O método Elenchos foi objeto do estudo anterior “A Aplicação do Elenchos Socrático no Diálogo Laques ” (LEITE, Léo Demétrius Lassi Dias da Mota. 2008), onde foi detalhadamente analisado.
[3] - o discurso braquiológico é aquele que contém brevidade na expressão verbal. É objetivo, sem afetamentos ou ornamentos de oratória.
[4] - Trasímaco era um conhecido Sofista.
[5] - A tradução mais aceita para a palavra eudaimonia é o conceito de felicidade.
[6] - Na antiguidade grega, erística era a arte ou a técnica da disputa argumentativa no debate, desenvolvida, sobretudo, pelos sofistas, e baseada em habilidade verbal e acuidade de raciocínio. Em Platão e também em Aristóteles, é a argumentação que, buscando unicamente a vitória em um debate, abandona qualquer preocupação com a verdade.
[7] - Pireu era uma demo portuária de Atenas acerca de 6 km da cidade, qual, hodiernamente, é parte da região metropolitana da capital grega.
[8] - Irmão de Platão e de Adimanto, todos filhos de Aríston.
[9]  - Amigo longevo de Sócrates.

[10] - Na cultura helênica, Hades é a dimensão para onde vão os mortos. O local é governado pelo deus também chamado de Hades e pela rainha Perséfone.

[11] - Poeta grego
[12] MORAIS, Emília Maria de Mendonça. In: “Justiça e Ontologia: a dialética do ser e do parecer n’Á República”.

[13] - Cumpre observar que idealizar um exercito propriamente dito, uma força armada institucionalizada e pertencente ao Estado é, até então, uma inovação, posto que no mundo helênico os cidadãos civis compunham as fileiras militares e  combatiam nas guerras. Do mesmo modo a estrutura bélica era fomentada pela iniciativa privada e não pelo tesouro público.
[14] - Trata-se da obra “La Exposicion de la República de Platón, uma tradução de Miguel Cruz Hernandes para o Espanhol da obra de AVERROES, Abu-L-Walid Ibn Rusd, cujo título original é Taljis Kitab al-Siyasat Aflatun